Indefinição sobre STS-10 suspende análise de restrições à movimentação
Diretoria da ANTAQ avalia que projeto de Tecon passa por reestruturação e que não cabe posicionamento definitivo quanto a aspectos concorrenciais estabelecidos anteriormente
A indefinição sobre o futuro do projeto de um novo terminal de contêineres no Porto de Santos (STS-10) fez com que a Agência Nacional de Transportes Aquaviários (ANTAQ) suspendesse, na última semana, a análise de embargos apresentados pelas empresas Maersk e a TiL, que solicitaram a revisão do processo em que a autarquia aprovou as contribuições da audiência pública, realizada em 2022, sobre a licitação. O diretor-geral da ANTAQ e relator do processo, Eduardo Nery, entendeu que não se justificaria um posicionamento definitivo com relação a essa matéria, levando em consideração a indefinição de cenário do STS-10, que pode inclusive ser completamente reformulado.
Ele acatou as considerações da diretora-revisora, Flávia Takafashi, para sobrestar a análise até a estruturação e definição do projeto. Ele determinou que a agência acompanhe a tramitação do certame junto ao Ministério de Portos e Aeroportos (MPor). Nery acrescentou que as primeiras restrições à concorrência foram propostas sem a possibilidade de ouvir o mercado sobre impactos das restrições. As empresas peticionantes alegaram que as cláusulas de limitação da movimentação inicial do STS-10 impediriam, na prática, a participação de empresas (Maersk e MSC) no leilão, criando uma proteção de mercado às empresas incumbentes do terminal no complexo portuário.
“A agência não teve intenção de constituir reserva de mercado a quaisquer terminais. Seria uma medida contrária aos dispositivos legais que estabelecem que o gerenciamento da infraestrutura portuária deve se pautar pela promoção do ambiente concorrencial”, ressaltou durante a 543ª reunião ordinária da diretoria da ANTAQ. Segundo Nery, a proposta apresentada visa evitar que a entrada de um novo player no mercado force a saída, sem justa concorrência, daqueles já estabelecidos, ocasionando maior concentração e possível deterioração do mercado regulado.
O diretor-geral da ANTAQ frisou que a limitação temporária sugerida pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) e acatada pela agência merece ser mantida, o que não invalida que a cláusula seja aprimorada. O órgão antitruste propôs que a ANTAQ implementasse medidas concorrenciais para mitigar eventuais efeitos lesivos, caso algum terminal verticalizado viesse a ser o vencedor da licitação do STS-10. Para atender à recomendação do Cade, foi proposto que, durante o período do contrato, os limites estabelecidos para monitoramento de eventual conduta anticoncorrencial fossem fixados com fundamento em limites de movimentação do terminal, porém com possibilidade de serem ultrapassados, desde que com apresentação de justificativa.
Nos autos, Maersk e TiL demonstraram preocupação com a possibilidade de um armador verticalizado não poder atracar no STS-10 pelas limitações defendidas pela ANTAQ, sendo obrigado a direcionar suas embarcações para outros terminais, mesmo apresentando níveis de serviços e preços inferiores aos oferecidos pelo STS-10. O relator salientou que essa situação jamais foi pretendida pela agência e não pode ser admitida.
"Constato que a redação sugerida merece reparos de forma que fique claro a possibilidade de a arrendatária exceder a movimentação máxima consignada, desde que seja comprovada impossibilidade de atendimento pelos demais terminais com os mesmos níveis de serviço e preços praticados pela arrendatária ou que fique comprovado impossibilidade de atendimento pelos demais terminais do mesmo complexo de picos de demanda, sazonalidade ou de outra situação conjuntural de curto prazo", afirmou Nery.
O diretor-relator acrescentou que o prazo pelo qual o terminal STS-10 ficará limitado a movimentar cargas com base no capacity share foi calculado para afastar o risco de competição imperfeita caracterizado por um direcionamento de cargas a terminais pertencentes a grupos econômicos de armadores verticalizados. "Ao me debruçar novamente sobre os valores de movimentação, observo que o prazo da limitação imposta pode ter sido por demais alongado, caso a capacidade do terminal BTP apresentado nos estudos do STS-10 esteja superestimada ou mesmo as condições de demanda encontrem-se subestimadas. Fizemos aquela avaliação com base em cenários que podem não se confirmar", analisou.
Nery entendeu que é razoável considerar a capacidade estimada para o terminal da BTP com base nos valores analisados e aprovados pela agência em processo específico sobre a gestão do contrato daquela empresa para fins de estimativa do prazo da imposição dessa limitação de movimentação. Com isso, o prazo estimado para imposição da limitação se estenderia até 2032.
A Maersk questionou a possibilidade de falta de incentivos à atração de novas cargas causas pela movimentação imposta pela limitação imposta à movimentação do STS-10, argumentando que medidas defendidas pela agência criarão reservas de mercado aos terminais não verticalizadas já que, se mantidas restrições, tais terminais se tornarão únicos a poderem receber essas novas cargas, independente de seu nível de serviços ou da eficiência dos serviços prestados. Já a TiL argumentou que as projeções de demanda são bastante conservadoras e que os cálculos deveriam ser ajustados para que se tenha real noção do contexto.
Nery entende que cabem melhorias à redação da movimentação de cargas no STS-10 de modo a capturar cenários em que projeção superem estimativas consideradas pela agência. "A limitação baseada em horizonte temporal não fará sentido caso as projeções não se concretizem. Ainda que a demanda superasse muito o projetado, estaríamos a estabelecer um limite com base num prazo que pode ser que não se justificaria", avaliou.
Em outros pontos apontados nos embargos, Nery não viu a necessidade de rediscussão por entender que já foram exaustivamente na fundamentação no processo. Ele citou a métrica de limitação da movimentação baseada na relação capacity share/market share; os mecanismos de controle de abusividade propostos pelo grupo de trabalho constituído pela ANTAQ; o posicionamento do Cade em notas técnicas de 2022; e eventuais riscos concorrenciais decorrentes de potencial adjudicação do leilão STS-10 pela Santos Brasil.
A diretora-revisora lembrou que ocorreram modificações ao longo do processo, que inicialmente seguiria para licitação isoladamente, depois seria inserido numa concessão da administração portuária de Santos, havendo atualmente uma nova mudança de direcionamento porque a concessão do porto passa por reajustes e notícias de que o STS-10 passa por redefinição. “O objetivo [da agência] é manter a concorrência sem fazer reserva de mercado, nem para verticalizado, nem para o que não tinha interação com o armador”, disse Flávia Takafashi. O voto foi acompanhado pelos demais diretores: Alber Vasconcelos, Caio Farias e Wilson Lima Filho.
Na semana passada, o secretário nacional de portos e transportes aquaviários, Fabrizio Pierdomenico, disse que processo para licitação para novo Tecon em Santos está em aberto e levará em conta pedidos de prorrogação contratual da BTP e da Ecoporto. "Estamos analisando o quanto é importante a renovação e o que significa do ponto de vista de investimento essas duas possíveis renovações (Ecoporto e BTP), que afetariam o STS-10. Por isso, o STS-10 está em aberto”, afirmou Pierdomenico, durante o evento Santos Export. O secretário também não descartou a possibilidade de não renovar. "A depender das decisões tomadas e das renovações que forem feitas, vai mudar a cara do STS-10. Inclusive não existir mais o STS-10. Essa é uma possibilidade", ressaltou.
No mesmo evento, o Centro Nacional de Navegação Transatlântica (Centronave) alertou para a necessidade de espaço físico para a carga no maior porto da América Latina, considerando o aumento da taxa de ocupação dos terminais de contêineres em Santos e que o projeto de um novo megaterminal (STS-10) está indefinido, podendo ser remodelado ou até não ocorrer em detrimento de outras soluções. "Se não sai nem o que temos dentro do porto [licitação do STS-10], como podemos prever, planejar ou nos comprometer com mercado com tamanhos de navio com capacidade de oferta de espaço para o transporte marítimo?", indagou o diretor-executivo do Centronave, Claudio Loureiro.
Site: Portos e Navios – 26/05/2023