2022-10-25
Transportes de grãos, fertilizantes e combustíveis estão quase paralisados no Madeira

Abani avalia que, além da falta de chuvas ao longo de 2022, barragem das hidrelétricas de Jirau e Santo Antônio prejudicou navegação na região Norte

Os transportes de grãos, fertilizantes e combustíveis via navegação estão praticamente paralisados no Rio Madeira, que integra a bacia do Rio Amazonas, banhando os estados de Rondônia e do Amazonas. Com um total de aproximadamente 3,3 mil quilômetros, ele é o 17º maior do mundo em extensão, o que traz uma série de problemas em torno de sua manutenção, além do agravamento decorrente da barragem das hidrelétricas de Santo Antônio e Jirau, conforme alertou Claudomiro Carvalho Filho, presidente da Associação Brasileira para Desenvolvimento da Navegação Interior (Abani).

“Ao contrário do que dizem que o Madeira é uma hidrovia, eu costumo fazer essa correção, tratando-o como rio navegável, considerando que ele ainda está do mesmo jeito que a natureza nos deu, O que tivemos de intervenções envolvem a barragem de Jirau e de Santo Antônio, o que foi muito prejudicial para a navegação. Quando criaram o barramento, muito pouco se preocupou com o que iria acontecer no Baixo Madeira. E o que vimos, nesses últimos dez anos, é uma mudança significativa a cada verão, a cada período de estiagem no rio”, disse Carvalho Filho, à Portos e Navios.

De acordo com ele, apesar de o governo estadual ter feito um esforço de melhoramento da dragagem, nos últimos cinco anos, o Madeira é um rio gigante, com muitos sedimentos, descendo em uma velocidade que vem causando o assoreamento do rio. “O advento do barramento das hidrelétricas mexeu um pouco na fisiologia do rio. Então, ele já não tem a mesma velocidade que tinha antes, para empurrar esse sedimento rio abaixo e ir rasgando o canal”, informou o presidente da Abani. Fora isso, ele relatou que 2022 tem sido um ano de poucas chuvas: “Já era para estar chovendo nos altos rios que formam o Madeira, que são os rios da Bolívia – Beni, Mamoré e Guaporé –, que também deságuam nele”.

O Rio Beni, que nasce na cordilheira dos Andes e deságua no Rio Madeira na fronteira com o Brasil, banha a Bolívia. Já o Mamoré é um curso d’água da bacia do Rio Amazonas, que nasce da confluência dos rios Chapare e Mamorecillo, entre as cidades bolivianas de Santa Cruz e Cochabamba, 24 quilômetros ao sul da foz de um de seus grandes afluentes, o Rio Grande. Conhecido na Bolívia como Rio Iténez, o Guaporé, por sua vez, também é um curso d’água da bacia do Rio Amazonas, no Brasil e na Bolívia, responsável por banhar os estados de Mato Grosso e Rondônia, além dos municípios bolivianos de Santa Cruz e Beni, servindo de divisa entre os dois países.

Prejuízos no abastecimento

“Na semana passada, o volume d’água chegou a subir, mas entendemos que ela não veio para firmar, fazendo o que chamamos de repiquete. Por esse conjunto de fatores, temos passado por dificuldades em relação aos transportes de grãos, fertilizantes e combustíveis, que estão praticamente paralisados. O que estamos conseguindo fazer no Madeira é a navegação com calado mais baixo, pelo qual estamos realizando o transporte de cargas, principalmente de gêneros alimentícios, para Manaus”, ressaltou Carvalho Filho.

Conforme o executivo, as consequências desse cenário têm sido um custo elevado do transporte de cargas, levando em conta a falta de condições de navegar à noite. “Isso tem aumentado o tempo de viagem e reduzido a capacidade de cargas das embarcações, trazendo impactos na falta de produtos em Porto Velho e Manaus”, informou ele, destacando que, em Porto Velho, o maior entrave tem sido na distribuição de combustíveis e em Manaus, na distribuição de gêneros alimentícios, materiais de construção, entre outros.

Segundo Carvalho, o agronegócio também não tem conseguido transportar grandes quantidades de fertilizantes para a exportação. “Tudo isso é consequência da estiagem no Rio Madeira, que tem sido muito dura para nossa região”.

Outra mazela tem sido a questão do garimpo ilegal: “Essa época em que o rio está seco, há uma invasão de três mil dragas que garimpam o leito do rio, mexendo nele e dificultando a navegação. Isso realmente é um problema grave para a navegação. Portanto, fora o rio estar seco, fora não conseguirmos navegar com o volume de carga satisfatório para o equilíbrio econômico da viagem, ainda temos essa questão do garimpo. Conciliar navegação com o garimpo não é tarefa fácil, pois essa atividade acaba sendo muito maior do que a navegação”.

Cabotagem

O diretor-executivo da Associação Brasileira dos Armadores de Cabotagem (Abac), Luis Fernando Resano destacou que a influência negativa do Rio Madeira no transporte de cabotagem tem sido, de fato, decorrente do assoreamento na foz do rio, quando ele encontra o Rio Amazonas, que é a rota de atuação desse sistema de navegação observado pela instituição.

“O cenário ficou mais grave pela seca mais rigorosa, que a região está sofrendo. Esses dois fatores – seca e assoreamento na foz do Rio Madeira – têm obrigado os navios da cabotagem a irem ou voltarem de Manaus com calados menores, portanto, com menor capacidade de carga, especialmente em um momento em que as cargas, que atenderão a Black Friday e o Natal, estão sendo movimentadas”, comentou Resano à Portos e Navios.

De acordo com Resano, essa situação impacta seriamente a região e a indústria da Zona Franca, comprometendo o abastecimento e o escoamento da produção. “Adicionalmente, a batimetria dessa região mais crítica encontra-se desatualizada, dificultando a identificação de um ‘canal seguro para a navegação’. De imediato, entendemos que precisamos de uma atualização batimétrica da foz do Madeira. Em médio prazo ou para o próximo ano, nós precisamos de dragagem no Rio Amazonas, especificamente na foz do Madeira”, salientou o diretor-executivo da Abac.

Alinhado a esse trabalho, ele também citou a necessidade de analisar as dragagens do Rio Madeira e as operações de garimpo ilegal, que podem ser duas das causas do assoreamento do Rio Amazonas. “As empresas de navegação buscam soluções para manter o atendimento da região. Para tanto ou operam com capacidade reduzida – o que é ruim, pois tornam as operações mais caras – ou estão operando com navios de menor portem fazendo o transbordo de carga em portos marítimos”, disse Resano,

Ele também informou que a Abac tem mantido contato direto com a Marinha do Brasil, Ministério da Infraestrutura e Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT), com o apoio da Federação Nacional das Empresas de Navegação Aquaviária (Fenavega), em busca de melhores soluções de navegabilidade nos rios Madeira e Amazonas.

Site: Portos e Navios – 25/10/2022


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