Problemas centrais não estão na agenda de desestatização, aponta consultor
Frederico Bussinger observa foco do processo da nova concessão de Santos no plano de investimentos. Ministério da Infraestrutura afirma que questões estratégicas, assim como as operacionais, estão abertas para discussão na audiência pública.
O consultor portuário Frederico Bussinger avalia que os problemas centrais do Porto de Santos (SP) não são os mais apontados na agenda de desestatização que se encontra audiência pública. Ele considera que o item mais apresentado nas discussões vêm sendo o plano de investimentos em obras, deixando de aprofundar outras questões como, por exemplo, a centralização do processo decisório e o planejamento integrado. Durante audiência pública, na última semana, Bussinger chamou a atenção para a necessidade de que o processo chegue ao final com evolução de aspectos operacionais e estratégicos.
“Temos que desentranhar o processo de mudança da governança, a modelagem do plano de investimento e a questão do planejamento e regulação. São temas que precisam ser tratados mais separadamente”, disse Bussinger, na última quarta-feira (16), durante audiência pública sobre desestatização e o trabalho portuário, promovido pela comissão permanente de assuntos portuários, na Câmara Municipal de Santos.
Na ocasião, o secretário-executivo do Ministério da Infraestrutura, Fabio Lavor, disse que as questões estratégicas, assim como as operacionais, estão abertas para discussão. “Já mudamos em vários momentos questões consideradas estratégicas: arrendamentos que deixamos de fazer, agrupamos em blocos, outros que segregamos ou mudamos completamente a modelagem (...) Temos que ter grau de pragmatismo e saber o grau de liberdade para avançar”, analisou.
Lavor concordou que a Lei 12.815/2013 foi centralizadora e retirou competência das autoridades portuárias para a Secretaria de Portos, mas ressaltou que o movimento agora está na direção contrária. “Estamos retirando competências do poder concedente e repassando para a autoridade portuária. O movimento de agora é claramente descentralizador, ao mesmo tempo que resgatamos poder do CAP [Conselho de Autoridade Portuária] na discussão, seja do PDZ [Plano de Desenvolvimento e Zoneamento do porto], seja da poligonal”, detalhou.
O secretário-executivo do Minfra disse ainda que a burocracia impede que gestor portuário público possa exercer suas qualidades em sua plenitude. “Temos hoje em Santos excelentes gestores, temos dinheiro em caixa, mas por questões burocráticas não conseguimos avançar na discussão de um contrato de dragagem e o porto hoje está com problema de dragagem. Certamente, se houvesse gestores privados com liberdade de atuação, esse problema estaria equacionado, não tenho dúvidas”, disse.
Para Bussinger, a maior responsabilidade da autoridade portuária não é a execução de investimentos, e sim ampliar a governança para garantir soluções isonômicas de competição de forma a permitir benefícios ao usuário e ao dono da carga. O consultor acrescentou a necessidade de integração urgente do porto com as ferrovias para que a carga chegue com mais eficiência. Ele disse que há muito tempo se discute que essas malhas deveriam ser integradas dentro de visão única planejada e gerida unificadamente.
O consultor entende que a parceria entre a gestão pública e iniciativa privada foi bem sucedida desde a década de 1990 do ponto de vista operacional, com atração de investimentos, redução de custos, aumento de capacidade e de movimentação. Ele acrescentou que o próprio governo destaca os resultados da atual gestão. Bussinger mencionou que, em quase 30 anos, o porto ampliou em mais que quatro vezes o volume movimentado, chegando perto de 150 milhões de toneladas em 2021, e que os investimentos privados se conseguiram se concretizar.
Bussinger disse ainda que as funções de planejamento seguirão com o Ministério da Infraestrutura e as funções de regulação com a Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq), o que significa a hiper centralização do processo decisório do mundo portuário, quando a característica central do modelo landlord no setor portuário é autonomia. O consultor calcula que, dos R$ 30 bilhões de aportes previstos anunciados pelo governo neste processo desestatização, o novo concessionário entraria com R$ 574 milhões para comprarar ações, assumindo a empresa, integralizando a subsidiária do túnel e com acesso a R$ 1,3 bilhões em caixa.
O diretor de desenvolvimento de negócios e regulação da SPA, Bruno Stupello, ressaltou que o caixa não fica com concesionário privado assim que ele assumir o porto e que não haverá transferência de recursos. Segundo o diretor, grande parte desse investimento será relacionado à dragagem de manutenção. “Essa flexibilidade de contrato privado com privado que se busca no modelo de desestatização. Hoje temos muita dificuldade na contratação público-privada para fazer gestão desses grandes contratos”, comentou.
O presidente SPA, Fernando Biral, frisou que haverá concessão sem transferência de patrimônio público para nome do concessionário, tampouco venda de patrimônio. Ele defendeu que desestatizar é a única forma de criar mais empegos e que a perda de carga para outros portos do país significa perda de empregos. “O compromisso é com geração de emprego. Santos é para ter 60.000, muito mais trabalhadores portuários e, para isso, precisamos de investimento. Desestatização não é venda de ativos”, afirmou.
Stupello acrescentou que o aumento da movimentação de cargas traz a necessidade de mais trabalhadores. A previsão, segundo o diretor de desenvolvimento de negócios e regulação da SPA, é que o complexo movimente perto de 240 milhões toneladas até 2040, o que só será possível com investimentos e aumento de quantidade postos de trabalho.
Site: Portos e Navios – 23/02/2022
