2021-10-14
Entidades acreditam em possibilidade de fabricação contêineres no Brasil

Avaliação é que país tem condições de buscar parceiros e incentivos para voltar a fabricar equipamentos localmente, o que aumentaria segurança de exportações. Com subsídios, China concentra maior parte do mercado atualmente,

Transportadores marítimos de longo curso avaliam que a fabricação de contêineres no Brasil poderia contribuir para atenuar a pressão sobre as exportações, principalmente para a capacidade extra nesse período de congestionamentos em grandes portos no hemisfério Norte. A avaliação do Centro Nacional de Navegação Transatlântica (Centronave) é que ainda existem muitos desafios para que essa hipótese se torne realidade, principalmente do ponto de vista de custos, mas que poderiam ser concedidos por meio de incentivos em benefício do comércio exterior brasileiro e da competitividade. O diretor-executivo do Centronave, Cláudio Loureiro, disse que tem lançado em alguns fóruns essa provocação a respeito do tema, que já vinha gerando certa ‘inquietação’.

Ele observa instalações industriais recém desmobilizadas que poderiam ser aproveitadas para a montagem desses equipamentos no Brasil, assim como metalúrgicos e profissionais qualificados. Loureiro vê a possibilidade de esse negócio poder atrair, por exemplo, fabricantes chineses. Hoje, eles concentram mais de 90% da produção mundial, com a China fabricando 600.000 contêineres por mês. A competitividade dos custos de mão-de-obra, no entanto, afastou outros países dessa atividade.

Loureiro defende que as políticas de tributação estejam mais abertas ao comércio exterior. Ele explicou que o contêiner construído no exterior e que entra em território brasileiro a bordo de navio estrangeiro chega com dispositivo legal de ‘internação temporária’, sem pagar tributo porque se supõe que cumpre uma função logística. O diretor do Centronave sugeriu que se olhe o contêiner produzido em território nacional da mesma forma, a fim de inviabilizar a produção.

“Temos aço, minério, siderurgia, área, mão de obra (...). Falta juntar pedaços do mosaico. Tenho fé de que se fizesse a aproximação com parceiro internacional para diversificar geograficamente as condições, poderia vir a ser uma linha de montagem. Temos todos os insumos, por que não?”, indagou Loureiro à Portos e Navios. O executivo acrescentou que muitos itens para a fabricação dos contêineres são de complexidade relativamente baixa.

A Câmara Brasileira de Contêineres (CBC) avalia que a situação tem se agravado nos últimos 40 dias, com a sensação de falta de contêineres sendo crescente no mercado diariamente. O presidente da CBC, Silvio Campos, observa que não é a primeira vez que há uma crise de desbalanceamento, porém destacou que o colapso das cadeias logísticas, durante a pandemia, atingiu a disponibilidade de navios e de contêineres. A CBC afirma que está sempre à disposição para o diálogo com armadores e governo, com quem tem participado de reuniões a fim de buscar soluções para esses problemas.

A entidade avalia que o impulso à fabricação no Brasil é uma questão de interesse do mercado de investir e de acreditar no país. O entendimento é que as sinalizações dos armadores indicam que existem atores pensando nas possibilidades e condições para fazer contêineres no Brasil. “Aqui temos know how, já fizemos milhares de contêineres. Temos aço, caldeiraria especializada (...). O ideal hoje seria montar uma fábrica robotizada para termos competitividade. Temos tudo para dar ‘start’ numa fábrica. Na hora que quiserem, estaremos preparados”, projetou. Campos explicou que, com uma linha de montagem robotizada, o uso de mão de obra seria praticamente zero.

O presidente da CBC considera que parcerias com empresas de outros países são possíveis porque o mercado é aberto a empresários estrangeiros interessados em estabelecer uma fábrica no Brasil. Ele ressaltou que esse cenário não é permanente e que chegará o momento em que haverá estabilização na parte do navio e do contêiner, o que deve ser estudado pelos interessados em montar uma unidade para produzir esses equipamentos. A previsão, segundo Campos, é que o mercado ainda passe um ano com certa dificuldade e se estabilize gradativamente.

Campos salientou que o maior desafio é chegar a um preço competitivo e poder aplicá-lo depois da crise. Ele estima ser possível montar uma fábrica dessas no Brasil em menos de um ano, porém dependeria de incentivos do mercado e redução de impostos. Campos explicou que o contêiner é estratégico para a China, uma vez que o país não pode ficar dependente do retorno de contêineres vazios ao país para manter as exportações nos níveis atuais. A percepção é que os chineses sempre conseguem fixar preços abaixo do mercado para ter garantia que o armador sairá com contêiner carregado da China e vai comprar novos equipamentos no país asiático.

A China é o principal fabricante de contêineres do mundo. O presidente da CBC disse que, quando os chineses entraram nesse mercado, há cerca de 10 anos, fecharam praticamente fábricas por todo mundo, incluindo África do Sul, Inglaterra, Itália, Estados Unidos e Brasil, pois os países não conseguiram suportar o preço dos concorrentes. Os últimos levantamentos feitos pela CBC apontam que os chineses mantiveram por muito tempo o preço da unidade de 20 pés a menos de US$ 2.000, graças a subsídios do governo chinês, enquanto o custo para se fazer equipamento similar no Brasil não saía por menos de US$ 3.500 dólares, com todos incentivos disponíveis.

A regra na navegação, em linhas gerais, é que o armador precisa ter três contêineres para cada slot que tenha no navio: um na origem, um a bordo e um no destino. A CBC é a favor da revisão da regra ‘3 para 1’, pois avalia que ela deixou de ser eficiente. Nesse contexto, uma das saídas para o comércio exterior brasileiro seria a fabricação local. Campos lembra que, com a paralisação de fábricas chinesas durante a pandemia, o país deixou de fabricar milhares de contêineres por mês. Durante o encalhe do cargueiro Ever Given em Suez, mais de 300 navios ficaram parados nos dois sentidos, trazendo prejuízos à cadeia logística mundial.

A CBC espera que o tema volte a ser discutido, a partir da perspectiva de que o transporte marítimo mundial ainda enfrentará dificuldades em 2022. O presidente da CBC ressaltou que uma das premissas para a instalação local para montagem de contêineres é que o país exporte mais do que importe. Para Campos, seria importante que os armadores não deixassem a fabricação dos contêineres na mão de um único país. “O Brasil é um país que pode ser escolhido porque sempre exporta mais que importa. Sempre haverá a possibilidade do contêiner já sair carregado do país”, afirmou.

Para abreviar o ciclo da falta de contêineres naquele determinado país ou porto, o armador reposiciona contêineres vazios onde tem disponibilidade. Com os atuais gargalos logísticos mundiais, até contêineres frigoríficos estão sendo utilizados para transporte de carga geral. As atuais previsões dos especialistas são de que essa crise seja normalizada por volta de 2023. Campos reforçou que essa logística é tão importante que o governo chinês chega a subsidiar o aço para manter esse preço, bancando a diferença do custo internacional para a logística dos produtos deles não dependerem do retorno do contêiner vazio. Ele lembrou que o Brasil já teve duas fábricas de contêineres que fecharam por causa da concorrência chinesa.

Um dos principais problemas logísticos atuais, segundo o Centronave, foi causado pela demanda acima do normal nas economias desenvolvidas, principalmente Estados Unidos e China. O Centronave pondera que o estoque estático de capacidade do transporte de contêineres não foi alterado durante os quase dois anos de pandemia. A entidade, que representa transportadores de longo curso que operam no Brasil, afirma que não foram retirados navios ou serviços nesse período, a ponto de reduzir a quantidade de equipamentos. A associação reitera que as companhias continuam a empregar toda e qualquer capacidade disponível, adiando a desativação de embarcações antigas e executando reparos ainda que 'antieconômicos' em contêineres danificados, com o objetivo de mitigar a atual crise de capacidade.

Site: Portos e Navios – 14/10/2021


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